Vários países em desenvolvimento sofrem com a presença de poluição plástica excessiva. Esse recurso de petróleo poderia ser uma mercadoria valiosa, uma vez que é preciso uma enorme quantidade de CO₂ e energia para criar um plástico novo. O plástico é mais valioso quilo por quilo do que o aço e é uma pena desperdiçá-lo. Então, não seria uma boa ideia fazer as pessoas que vivem em extrema pobreza terem a oportunidade de ganhar um salário por meio da reciclagem?

Existem milhões de toneladas de plástico nos oceanos e cerca de 80% desse plástico vem de países que podem ser considerados países mais pobres. Indivíduos que lutam para alimentar suas famílias e mandar seus filhos para a escola, não têm tempo para se preocupar com a reciclagem e muitas vezes não estão cientes dos efeitos da poluição no meio ambiente. Para resolver esse problema, David Katz fundou o Plastic Bank, uma empresa que está usando o plástico oceânico para erradicar a pobreza. O banco paga as pessoas para coletar resíduos plásticos em troca de itens práticos como alimentos, dinheiro e roupas.

Os desafios: falta transparência

A cadeia de abastecimento tradicional da reciclagem informal nos países em desenvolvimento tende a ser um sistema muito explorador. Os catadores na base da cadeia de reciclagem enfrentam vários desafios ao tentar acessar preços de mercado justos para os plásticos descartados que coletam.

A economia informal da reciclagem é intrinsecamente problemática, pois falta transparência e muitas vezes não é regulamentada. Os intermediários são incentivados a comprar na baixa e vender na alta, sem se importar com os impactos sociais e ambientais. Isso resulta em altos níveis de desconfiança e desigualdade na cadeia de abastecimento.

Capital de giro e preço inconsistente

Outro problema é o acesso ao capital de giro. No sistema atual, os intermediários precisam esperar até que o comprador final feche a compra, antes de terem dinheiro para pagar os catadores. Os catadores são geralmente pagos semanas ou meses depois. A principal barreira final dos catadores é a flutuação constante do preço do plástico descartado. O catador geralmente experimenta 40-50% de volatilidade no preço que recebe. Criar transparência e responsabilidade através da cadeia de abastecimento também resulta em um material de melhor qualidade.

Educação e inclusão econômica

A inclusão econômica é o fator mais importante para ajudar aqueles que estão na base da cadeia de abastecimento a escapar da pobreza. No entanto, também é imperativo que os catadores tenham acesso à educação financeira e serviços sociais. Eles devem ter suas vozes ouvidas a fim de defender reformas de políticas que abordem a desigualdade. 

É preciso criar mercados para o plástico reciclado em comunidades com infraestrutura deficiente de gerenciamento de resíduos, acelerar o desenvolvimento de infraestruturas de reciclagem e mitigar a crise de poluição do plástico.

O que é economia informal de resíduos?

A crise global de resíduos está se acelerando. Com a geração de resíduos estimada para aumentar até 2050, os sistemas que gerenciam esses resíduos tornaram-se engrenagens vitais em nossa estrutura social. Embora as nações desenvolvidas tenham criado, ao longo do tempo, sistemas centralizados para isso, a maioria das cidades nas economias emergentes ainda depende de métodos fragmentados de gestão de resíduos nas chamadas economias informais de resíduos. Esses sistemas paralelos tornaram-se indispensáveis ​​para essas nações e, ainda assim, dificilmente recebem qualquer reconhecimento por suas contribuições. 

Origens das economias informais

As economias de resíduos informais começaram com o desenvolvimento de mercados não oficiais por catadores empreendedores que identificaram matérias-primas de valor nos fluxos de resíduos. 

A rápida urbanização das nações em desenvolvimento, entretanto, levou a um aumento na geração de resíduos sólidos que seus sistemas formais não estavam equipados para lidar. Com isso, a vasta migração de mão de obra não qualificada para áreas urbanas resultou em muitos assumindo trabalhos informais, como coleta de lixo, que estava começando a mostrar valor fiscal. Esses dois fatores impulsionaram a criação e o crescimento das economias informais de resíduos que existem até hoje. 

Economias de resíduos informais hoje

Os envolvidos nessas economias paralelas variam de catadores a revendedores de sucata e agregadores. Embora não seja regulamentado e bem fragmentado, o incentivo econômico de encontrar valor no material residual fez com que esses ambientes informais tivessem seu próprio sistema organizacional (com preços dependentes do potencial de reciclagem do material). Eles eliminam, segregam, agregam e reciclam os resíduos nos sistemas e se tornaram a parte principal de muitas estruturas de reciclagem em todo o mundo. 

Com o tempo, essas economias informais desenvolveram-se em comunidades estabelecidas como os catadores no Brasil. Em nações como a Índia, onde menos de 60% do lixo são coletados e cerca de 15% processados, essas economias informais tornaram-se engrenagens vitais no funcionamento da sociedade. Alguns relatórios até sugerem que em cidades como Cairo, eles são melhores que os sistemas formais de recuperação de recursos (mostrando certas vantagens em áreas urbanas específicas, como a experiência e os veículos para manobrar). 

Estigma social e falta de reconhecimento

Apesar de ter se tornado parte fundamental do processo de reciclagem e servir à sociedade, mantendo o lixo longe dos aterros e oceanos, essas comunidades estão sujeitas a estigmas sociais e péssimas condições de vida. Uma parte importante da razão disso existir é porque suas contribuições e impacto não são amplamente reconhecidos. 

Legitimar este setor informal é um passo necessário para remediar esta questão. Isso daria a seus participantes um senso de segurança e dignidade e os reconheceria por suas contribuições para a sociedade. 

Isso teve algum sucesso no Brasil, onde reconheceram o trabalho dos catadores informais, o que lhes permitiu introduzir esquemas para formalizar seus esforços. Mas na maioria das nações tem sido complicado para as autoridades mapear esses sistemas informais, uma vez que eles são de pequena escala e funcionam muitas vezes de forma clandestina.  As decisões políticas e a execução adequada das mesmas serão necessárias para criar uma mudança efetiva. Ao formalizar esses sistemas, as autoridades locais se beneficiariam incrivelmente ao compreender e adotar as práticas dessas economias informais com experiência em serem lucrativas no manuseio de resíduos. Também resolveria várias preocupações em relação à natureza não regulamentada e não controlada deste setor, garantindo que os resíduos coletados sejam tratados de forma responsável e segura.

Por que as taxas de reciclagem de plástico são tão baixas?

Aqui estão os seis principais fatores que inibem a economia circular nas regiões em desenvolvimento. 

1) Falta de coleta e a segregação domiciliar

Globalmente, cerca de 3,5 bilhões de pessoas não têm acesso a serviços formais de gestão de resíduos. O Banco Mundial estima que a geração global de resíduos sólidos está a caminho de aumentar 70% até 2025. O orçamento municipal não consegue acompanhar o crescimento do consumo porque o lixo doméstico não segregado é caro para coletar e processar.

Na maioria dos países em desenvolvimento, 80-90% das atividades de reciclagem são informais. Esses empreendedores de mineração urbana economizam milhões em recursos dos municípios ao evitar que os resíduos sejam enviados de caminhão para aterros sanitários. Uma abordagem centrada no ser humano é necessária para apoiar a economia de reciclagem informal e criar sistemas de mercado inclusivos.

2) Competição com plástico virgem

A indústria de plásticos virgens consome 6% do consumo global de petróleo. Isso é mais petróleo do que toda a indústria da aviação. As economias de escala tornam muito mais fácil para os fabricantes obter material virgem em vez de reciclar.

3) Volatilidade no valor da commodity

O valor da sucata de plástico muda costantemente. Aqueles que estão na base da cadeia de valor da reciclagem são os que mais sofrem com as flutuações de preço. Quando o valor da commodity do plástico cai, eles geralmente não têm economias com as quais contar. Os catadores de lixo costumam ser os membros mais marginalizados da sociedade, mas também são a força motriz da economia circular. Quando esses trabalhadores informais do lixo param de colocar plástico na cadeia de abastecimento, toda a indústria de reciclagem sofre.

4) Acesso ao capital

Muitos fundos multilaterais de desenvolvimento, como o Banco Mundial, têm bilhões de dólares orçados para investimento na gestão de resíduos. No entanto, essas instituições são incrivelmente ineficazes na alocação de capital para projetos de pequena escala. Os fundos multilaterais geralmente consideram apenas projetos de cinco milhões de dólares ou mais. 

5) Falta de tecnologia de processamento avançada

Existem pelo menos 267 tipos diferentes de polímeros plásticos. Quando esses diferentes tipos de polímeros são misturados, isso afeta as propriedades do material e pode levar a defeitos no processo de fabricação. Instalações de processamento avançadas são necessárias para criar um estoque original de plástico reciclado de alta qualidade para compensar o uso de materiais virgens.

6) Educação

A educação é talvez o fator mais importante nesta lista. O envolvimento e a conscientização são necessários em toda a cadeia de valor para resolver esses problemas complicados. Todos têm um papel a cumprir, desde o consumidor que compra de marcas responsáveis ​​até o designer que cria produtos que podem ser facilmente reciclados, mas o mais importante é que as marcas e os fabricantes precisam criar mercados para o fluxo de resíduos plásticos, escolhendo materiais reciclados de origem.

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Referências:

Espaço em Revista – COSTA, Wesley Borges.; CHAVES, Manoel Rodrigues.
CATADORES DE RECICLÁVEIS: ENTRE A INFORMALIDADE E A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO
DOI: 10.5216/er.v15i1.26195.
Disponível em: https://www.revistas.ufg.br/espaco/article/view/26195

CNN: We’re throwing away a fortune in plastic every year. This company is cleaning up –  By Tom Page, CNN
Disponível em: https://edition.cnn.com/2019/11/15/world/plastic-bank-sustainable-brands-oceans-2019/index.html

Projeto: Plastic Bank
Disponível em: https://plasticbank.com/

FMU – Reciclagem No Brasil: Panorama Atual E Desafios Para O Futuro
Disponível em: https://portal.fmu.br/reciclagem-no-brasil-panorama-atual-e-desafios-para-o-futuro/

How Can India’s Waste Problem See a Systemic Change?
Disponível em: https://www.epw.in/engage/article/institutional-framework-implementing-solid-waste-management-india-macro-analysis

The Economics of the Informal Sector in Solid Waste Management
Disponível em: https://www.giz.de/en/downloads/giz2011-cwg-booklet-economicaspects.pdf

Down to Earth – India’s challenges in waste management
By Samar Lahiry
Disponível em: https://www.downtoearth.org.in/blog/waste/india-s-challenges-in-waste-management-56753

How Can India’s Waste Problem See a Systemic Change? By Mathangi Swaminathan
Disponível em: https://www.epw.in/engage/article/institutional-framework-implementing-solid-waste-management-india-macro-analysis

O TEMPO – Pesquisa revela que preço pago em materiais recicláveis pode variar 400% na RMBH
Disponível em: https://www.otempo.com.br/economia/pesquisa-revela-que-preco-pago-em-materiais-reciclaveis-pode-variar-400-na-rmbh-1.2492588

ESTADO DE MINAS – Queda de preços de recicláveis dificulta vida de catadores
Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2020/05/11/interna_gerais,1146219/queda-de-precos-de-reciclaveis-dificulta-vida-de-catadores.shtml